Friday, May 19, 2006

C O N C E I T O S


“ O caminho faz-se ao andar” ( poema de A. Machado)
E eu decalco: o caminho faz-se caminhando...

Sento-me em frente ao computador e começo a bater as teclas, a tentar um estímulo para despertar a minha inspiração. Frequentemente esse fenómeno acontece : gosto de escrever , porque esta é a actividade que me motiva e ordena o pensamento e porque imagino que haverá alguém que me escuta, neste caso lê. Sinto a necessidade de comunicar, “vício” que ficou da minha actividade profissional Digamos que esta é uma ocupação de subsistência mental: o tempo não para, mas tenho a pretensão de resistir ao envelhecimento.

Falta-me um tema para desenvolver e conseguir um texto que desperte o interesse de meu imaginário leitor, tanto pelo conteúdo como pela forma. Aliás, das leituras que faço dos jornais dou sempre preferência aos articulistas cujo estilo conheço, assente tanto na clareza e vivacidade da sua comunicação como pela perfeita adequação dos termos e harmonia na estrutura da frase. Dos outros, dos que não me suscitam qualquer interesse literário, leio os títulos e, quando muito, faço uma leitura cruzada para obter a síntese da sua informação.

Tenho particular apreço pelos periódicos em que os seus colaboradores não estão sujeitos a uma censura interna : os artigos de opinião ou de teor crítico são, como é de preceito jornalístico, da inteira responsabilidade de quem os elabora. Apenas um requisito se impõe e esse é , como a educação cívica e princípio básico das regras sociais o requerem: o da não ofensa pelo insulto, o mesmo que o da não linguagem de baixo nível social, o da negação do termo soez , o da recusa do calão ordinário ou o da expressão obscena . Esta é a sinonímia que redunda na concisão do lema : o respeito pelos outros é o respeito por ti mesmo ou, respeita para seres respeitado.
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A ofensa gratuita contra a integridade moral de outrem repercute-se, tal “boomerang”, na honorabilidade do ofensor. Fazer a crítica de actos públicos ou de entidades socialmente responsáveis não será , obrigatoriamente, a constante maledicência sem argumentos plausíveis ou pelo direito de desafronta contra quem agride a sua própria dignidade..Dignidade ! Eis a palavra estímulo de que acima referi e que determina o assunto com que me vou ocupar concretamente, pronunciando meu entendimento sobre este conceito :
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Dignidade significa auto-estima, amor próprio que se cultiva com atitudes e actos que mereçam a atenção elogiosa de quem nos é próximo; é esse o maior bem por que um cidadão que se preza deve pugnar e manter no seu mais elevado valor, até na adversidade. Aliás, é nesta situação que o pundonor emerge e engrandece o carácter do indivíduo perante quem com ele se relaciona. Se, pelo contrário, ao contratempo não reage e se presta a ser fantoche ou bonifrate de quem, sem escrúpulos, por uma prometida côdea, o manipula a seu belo prazer, cometendo, em consciência, deslealdade para com quem teria motivos de sobra para se mostrar grato, esse indivíduo irá de mal a pior no conceito dos cidadãos íntegros.

Pode, o amor próprio, redundar em orgulho? E, por que não, se esse sentimento não revelar menosprezo por ninguém, mas, pelo contrário, se alicerçar numa conduta moral irrepreensível, também e, por isso mesmo, no merecimento de amizades sinceras. E, ainda, quem não se sente ufano quando é reconhecido pela sua inteira dedicação e sucesso no trabalho em prol da sua comunidade, por exemplo ? Mas se, neste caso, é perfeitamente legítimo no indivíduo o sentimento de orgulho, se este degenera em vaidade, é em animosidade dos seus concidadãos que o mesmo indivíduo transmuda a estima que lhe era merecida.
Vaidade é vanglória, fatuidade, presunção; é menosprezo por quem julga que lhe é inferior ou complexo de espírito mesquinho que teme perder a sua falsa auréola de ídolo, adorado pela crença de quem possa iludir com essa demagogia.

Orgulho é, por outro lado, antónimo de humildade, quando esta se constitui em submissão que leva frequentemente à subserviência. O orgulhoso não se deixa tornar humilde, o mesmo que dizer, não se deixa humilhar, antes reage com altivez perante quem pressente que o tente fazer. Entende ter criado uma situação de independência e só aceita o que julga ser-lhe merecido, incluindo a reciprocidade ou o correspondente gesto de reconhecimento pela sua lealdade. Neste capítulo, por vezes, acontece alguma situação de incomodidade sobre a atitude a tomar: obedecer de pronto ao impulso de recusa e demissão do cargo ou compromisso que voluntariamente tenha assumido, face a uma hipotética ofensa O orgulho não contradiz a modéstia. Ser orgulhoso não é deixar de reconhecer a simplicidade da sua condição social; é, antes, sentir-se em perfeita sintonia com gente que vive apenas à custa do seu trabalho honesto e, aí sim, merecer a simpatia e admiração da sua classe por alguma atitude de destaque que contribua para o prestígio colectivo.
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A propósito da diferença, que considero, sobre os conceitos de vaidade e orgulho, é com intenção que aqui os tenho pretendido distinguir exactamente para pôr em destaque a pertinência da propriedade dos termos: sinonímia não quer significar o indistinto emprego de um ou outro vocábulo, em alternativa, mas sim dependendo do contexto em que se inscrevam .

Assim se eu disser: Fulano está todo vaidoso por ter recebido uma medalha pelos bons serviços que tem prestado à comunidade; o termo vaidoso é perfeitamente substituível pelo seu sinónimo orgulhoso, não há a mínima alteração do sentido. Mas, se eu disser : Sicrano é um grande vaidoso, menospreza toda a gente que considera de condição socialmente inferior e até aos que são de sua classe se não forem seus louvaminheiros, se revela de uma condenável sobranceria. Aqui o vocábulo vaidoso não cabe, em substituição, com a mesma propriedade, de orgulhoso...
E, assim, andei mais uma etapa do caminho que, aqui e, até agora, sem obstáculos à afirmação da minha própria dignidade, vou caminhando.
Dimas Maio

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