Monday, September 18, 2006

Q U A N T O S ? !

Quantos olhos magoados sem
/esp’rança
Duma réstia de luz
Caminham nesta vida, sem bonança,
Presos à sua Cruz?!
Almas dilaceradas sem que alguém
Pressinta a sua dor
Sem que, por caridade, então
/ninguém,
Seja cireneu por um só instante,
Um instante de amor !
A turba passa alucinada, uivante,
Ou somente indiferente...,
São como as ondas do mar
Serenas ou em turbilhão
Vêm e vão... vêm e vão...
Enquanto o só
Amargurado,
Falho de dó
Caminha desamparado
Por entre a gente

24/X/2004 Reival


Pela estima de minha amiga Virgínia e pelo interesse que entendo merecer a sua poesia
transcrevo para aqui o que publiquei em “O COMERCIO DA PÓVOA n.º44 de 11/11/04 :

(...) Com a ênfase que lhe é devida, honremo-la com o epíteto de poeta a esta senhora da arte escrita. Não poetisa, por simples concordância de género . Poeta é o título honorífico que a consagra. “Alma de poeta”é a expressão que muito bem cabe para aludir ao sentimento que as suas pequenas produções nos transmitem com tanta devoção. De longe, no tempo, venho eu a admirar o seu estro, já aqui o declarei, mas, compreender-se-á a minha fé na arte que me coube, por dever de ofício (fui professor de literatura) estudar e transmitir, a quem me competia sensibilizar para o seu valor cultural
Para mim próprio, já tenho afirmado, também neste lugar, que a literatura é a arte das artes, já que, pela palavra se pinta, se esculpe, se modela e se musica. E a fraude não cabe no seu espaço.
A verdadeira poesia é metáfora. A metáfora eleva e pluraliza o sentido da palavra e é neste rumo que vou tentar fazer a leitura da prenda que a Reival, generosamente nos oferece:

Olhos são o espelho da alma , logo, quantas almas sofrem nas trevas? Sem esperança que a dor acalme estão presas à sua cruz. Instrumento conotado com a alma e é símbolo do limite máximo do sofrimento ( Cristo morreu crucificado). Almas (diz agora) angustiadas pelo abandono, sem caridade, sem dó, do seu semelhante, alheado pelo egoísmo. Cireneu é a metáfora da ajuda. Simão o cireneu da Bíblia, por amor, ajudou Cristo a levar a Cruz ao Calvário. Mas, aqui não há um instante da manifestação do amor de alguém A turba, isto é, o mundo louco, uivante ( os lobos uivam) ou alheado da sua existência ondula, em fluxos e refluxos ( as ondas do mar vêm e vão...) em remoinho ou serenamente ( é a guerra ou a paz). O só ( aqui o sujeito é singular) evoca os sonetos de António Nobre para um sentido do maior abandono.
Sintetiza, nos últimos cinco versos, muito apropriadamente, o que um ser humano concreto ( já não são as almas por abstracção) padece na sua dor de total isolamento por entre a gente.

Conclusão : É muito difícil , senão impossível reescrever o poeta, porque ele não expressa ideias, mas antes exprime sentimento.

No comments: